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Qual é a causa da Obesidade? E o que o modelo carboidrato-insulina tem com isso?

Atualizado: 8 de nov. de 2024



"...O modelo carboidrato insulina (MCI) considera que a alta deposição de gordura é resultado de respostas orgânicas à uma dieta de alta carga glicêmica. A alimentação rica em carboidratos simples faz com que o organismo impulsione o balanço energético positivo. Esse padrão alimentar gerará uma reprogramação metabo-hormonal (uma nova homeostase), que induzirá mais fome e desejos por alimentos similares."

Prof. Dr. Wellington Lunz - Universidade Federal do Espírito Santo 


A tese vigente é que a pandemia de obesidade tenha como causa o consumo excessivo de alimentos modernos (ex: processados), altamente palatáveis ​​e com alta densidade energética. Isso é agravado pelo sedentarismo. O nome desse paradigma clássico é "modelo do balanço energético" (MBE). Recomendo a leitura desse artigo, que me serviu de base para essa postagem.

Mas esse modelo "físico-matemático", onde calorias teriam sempre o mesmo efeito, independente da fonte, sofre críticas. As principais são desconsiderar os mecanismos biológicos que regulam o ganho de peso, e, ainda que de forma não intencional, lançar a culpa à "pessoa" obesa. Ou seja, no MBE "só é obeso quem não controla a consciência alimentar". É a simplificação do complexo.

Uma tese alternativa é o "modelo carboidrato-insulina" (MCI). Para o MCI, o problema não está relacionado a consciência da "pessoa" obesa. Isso porque as respostas hormonais e metabólicas dependem das fontes das calorias dietéticas (ou seja, qualidade da fonte), e não meramente das calorias. O MCI não nega que a alta ingestão energética seja um problema, mas entende que a culpa da alta ingestão é mais biológica e metabólica que de decisões conscientes.

O MCI considera que a alta deposição de gordura é resultado de respostas orgânicas à uma dieta de alta carga glicêmica. A alimentação rica em carboidratos simples faz com que o organismo impulsione o balanço energético positivo. Esse padrão alimentar gerará uma reprogramação metabo-hormonal (uma nova homeostase), que induzirá mais fome e desejos por alimentos similares. Então entramos num ciclo vicioso: "desejo-comer-desejo-comer(...)". E, sobre isso, a dieta com alta carga glicêmica tem papel central.




Essa reprogramação pode até mesmo alterar a palatabilidade, uma vez que a palatabilidade não é fixa, e pode ser aprendida.

Para esse modelo, o balanço energético positivo não seria a causa da obesidade no longo prazo, pois, considerando uma homeostase sadia, haveria sempre mecanismos contrarreguladores para impedir o ganho de peso. Quando pensamos nessa contrarregulação, a primeira coisa que vem à mente é o hipotálamo. Mas parece que a coisa vai bastante além disso:

Por exemplo, ao se anular o receptor de insulina de células adiposas de ratos, verificou-se menor ganho de peso gordo, apesar do consumo de energia ter sido similar ao grupo controle. E, em outro experimento, o tratamento com insulina gerou maior ganho de massa adiposa que no grupo controle, apesar de, novamente, consumo similar de energia. Esse tratamento também reduziu o gasto energético.

E coisas ainda mais simples já foram investigadas e confirmadas. Por exemplo, ratos e macacos que consumiram dieta com alto índice glicêmico (IG) ganharam mais peso gordo comparado àqueles com dieta de baixo IG, mesmo com ambos os grupos (alto vs. baixo IG) tendo consumido a mesma quantidade de energia. Esses efeitos parecem mais evidentes em estudos de longo prazo.

E coisas similares ocorrem com humanos. Por exemplo, tumores pancreáticos que secretam insulina podem causar ganho de peso, mas os que secretam glucagon causam perda de peso.

E, classicamente, há ainda as evidências dos camundongos ob/ob, que aumentam significativamente a adiposidade, mesmo com restrição de energia para evitar o ganho de peso excessivo.

Sabe-se que a insulinemia aumenta a fome, aparentemente por reduzir a quantidade de substratos no sangue. E essa fome (e apetite) é mais inclinada para alimentos com alto IG. E, também, a redução da oxidação de substratos energéticos parece capaz de aumentar a fome. Ou seja, ainda que o hipotálamo seja um grande regulador, o que acontece fisiologicamente na periferia corporal pode ser bastante importante.

De fato, os autores do artigo que usei de base lembram que durante a puberdade o consumo energético pode superar o gasto energético, sem que provoque sobrepeso. Então, questionam: "É o consumo que promove o crescimento corporal, ou é a necessidade de crescimento que comanda a maior ingestão?"

 nutricionistas com experiência em diferentes especialidades
O Prof Wellington Lunz apoia e recomenda o Instituto Afficere. Agende sua consulta nutricional.

A provocação é interessante, pois temos que refletir sobre o que exatamente nos faz ingerir mais. E será que somos todos capazes de dominar esse drive inconsciente?Isso tudo aponta que a qualidade da fonte calórica pode ser mais importante que a quantidade calórica.

No artigo base, eles apresentam uma figura que ilustra a complexidade disso, e como esse ciclo poderia gerar uma nova homeostase. Vou tentar resumir a ideia principal da figura:


1) A rápida absorção de glicose após o consumo de uma dieta com alto IG aumenta a secreção de insulina, e suprime a secreção de glucagon. Também aumenta o polipeptídeo insulinotrópico dependente de glicose (GIP), que é um hormônio bastante importante na regulação da secreção de insulina.


2) Nas primeiras horas após se alimentar, esse estado altamente anabólico promove uma ávida absorção de glicose pelos músculos, fígado e tecido adiposo, e estimula a lipogênese no fígado e tecido adiposo. Com a insulinemia persistente, a sensibilidade à insulina torna-se maior no tecido adiposo, e menor (resistência à insulina) em outros tecidos (ex: músculo).


3) Três horas depois de se alimentar, a maioria dos nutrientes de uma refeição com alto IG terá sido absorvida. No entanto, essas ações anabólicas irão reduzir a quantidade de substratos energéticos na corrente sanguínea. Podendo ficar em níveis inferiores ao estado de jejum.


4) Com isso, o cérebro entende que tecidos críticos (ex: fígado, cérebro) estão privados de energia, e reage com contrarregulação hormonal, sinalização de fome e desejo por alimentos com alto IG, para tentar restabelecer o equilíbrio no sangue. Entramos num ciclo vicioso, que conduzirá a uma reprogramação metabo-hormonal e balanço energético positivo.


5) Com à diminuição de substratos no sangue, o dispêndio energético também pode diminuir, devido alterações de vias termogênicas (ex: redução de células adiposas marrom em relação as brancas) e hormonais (ex: tireóide, vias autonômicas).

Se o MIC estiver correto, uma estratégia consciente para produzir um balanço energético negativo pode falhar para muitas pessoas. Os autores do artigo base também chamam a atenção para o fato de ser algo de longo prazo. Por exemplo, nos últimos aproximadamente 50 anos, o aumento estimado de gordura foi menor que 1 grama por dia. Embora temos hoje uma sociedade com ~10 a 15 kg a mais de peso comparado a 1970, isso não ocorreu de uma hora para outra.

O MIC acredita que no longo prazo é mais fácil ter controle sobre o que "você come" do que sobre o "quanto você come" (particularmente me identifico com isso!). Ao reduzir o impulso anabólico com uma dieta de baixo IG, as pessoas podem sentir menos fome e melhorar o controle do nível de energia, promovendo perda de peso espontânea, sem necessidade do controle consciente.

Mas, como é natural nas ciências, há também críticas a esse modelo. Os autores contra-argumentam as críticas, mas claramente há outras interpretações.

 nutricionistas com experiência em diferentes especialidades
O Prof Wellington Lunz apoia e recomenda o Instituto Afficere. Agende sua consulta nutricional.

Também quero destacar que, de minha parte, isso não tem a ver com a moda 'low-carb'. Digo isso porque eu não tenho estudado nada sobre 'low-carb', de modo que se houver alguma aproximação entre o que estou escrevendo aqui e essa moda, foi absolutamente não intencional.

O que particularmente percebo ainda como lacuna no MIC é a relação dessa estratégia com o microbioma intestinal, modificações epigenéticas e com o exercício físico (minha praia!). Sabemos que dietas com restrição severa de carboidratos podem tanto diminuir o desempenho físico como aumentar a chance de overtraining, como já mostrei em postagem anterior (acho que só no meu instagram @prof.wellingtonlunz).

Mas, claro, os autores não falam aqui de dieta com grande restrição de carboidratos, mas sim de redução e melhor escolha dos carboidratos para impedir essa cascata que enumerei acima (de 1 a 5).

Além disso (e por isso), é sempre necessário procurar bons profissionais da Nutrição. E, se você chegou até aqui, aproveite a oportunidade para fazer o curso do Instituto Afficere (@institutoafficere), pois lá você terá acesso a duas nutricionistas (nutricionistas + mestrado + doutorado) com 18 anos de experiência. Siga o Instituto, faça o curso, e aproveite para dominar essas coisas.

Eu sempre insisto que dominar conhecimentos e estratégias relacionadas a nutrição revoluciona a prescrição do treinamento físico (fora a economia, pois nunca vi tanta gente jogar dinheiro fora; ex: suplementos sem efeitos).

Para finalizar, eu tenho uma experiência interessante, e é uma das razões para eu ter compartilhado com vocês esse conhecimento. Sempre que eu como um "pão francês" (alto IG), pouquíssimo tempo depois estou com fome novamente. O mesmo ocorre com várias frutas (embora nesse caso temos a frutose envolvida, que é outro tema amplo). Mas essa ideia do "pãozinho" se encaixa bem no MIC.

E outra coisa interessante é que tenho tido, ao longo da vida adulta, boa experiência em reduzir meu peso corporal com dieta rica em vegetais, sem me preocupar muito com a quantidade de alimento. Ou seja, eu me preocupo em aumentar vegetais, e nada mais. E funciona bem. Logo, essa experiência também se encaixa nessa ideia do MIC.

Tendo clara a necessidade de acompanhamento nutricional (profissionais da Nutrição), recomendo que você compartilhe esse texto com pessoas que eventualmente sentem-se culpadas pelo próprio peso corporal. Conhece alguém?

Compartilhando você ajudará essa pessoa compreender que o peso corporal dela pode estar mais associado a fatores inconscientes, e não a uma limitação do autocontrole (o que tem gerado autoestigmatização). Nesse sentido, esse texto pode ajudá-lo/a a desestigmatizar a própria obesidade, e até mesmo a perceber que precisa de atendimento nutricional (as vezes outros profissionais) para uma "reconfiguração do metabolismo".

Aproveite para ler outras postagens do Blog e seguir minhas redes sociais. Estão descritas abaixo (ou do lado) da minha foto.


Até a próxima postagem!


Clique aqui e acesse videoaulas no 'Canal Prof. Wellington Lunz'.







 

Autor: Wellington Lunz é o proprietário desse Blog e do site www.wellingtonlunz.com.br. Também tem um canal no YouTube: (youtube.com/@prof.wellingtonlunz) onde transmite conhecimentos baseados em evidência de diferentes áres (ex: hipertrofia muscular, treinamento de força, musculação, fisiologia do exercício, flexibilidade). É bacharel e licenciado em Educação Física, Mestre em Ciência da Nutrição e Doutor em Ciências Fisiológicas. Atualmente é Professor Associado na Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Contato pelo site, e-mail: welunz@gmail.com.br 


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