"Os princípios do treinamento periodizado não eram comumente vistos na América do Norte durante a primeira metade do século XX. Por sua vez, a União Soviética havia se tornado uma potência Olímpica, o que foi principalmente atribuído a essa forma de planejamento do treinamento."
Autor: Leonardo Carvalho Caldas
Antes de começar, um informe: Essa postagem será dividida em duas para que possamos explorar um pouco mais esse conceito tão debatido nas ciências do desporto. A parte 2 está aqui.
Agora sim, vamos lá... A forma de descrever uma porção ou divisão do tempo é chamada de ‘período’, e é de onde se originou o termo ‘periodização’. Esse termo é muito usado em outras áreas, como a História, para dividir as fases ou períodos específicos (Idade da Pedra, Idade do Bronze, Idade do Ferro, Idade média) (Bompa e Buzzichelli, 2019).
Na área das ciências do esporte o termo periodização foi utilizado pelo fisiologista Russo Leo Matveyev, que desenvolveu um modelo de treinamento baseado nas práticas de preparação dos atletas russos na primeira participação da União Soviética nas Olimpíadas de 1952.
Em seu livro “The Problem of Periodization of Sport Training”, que foi publicado apenas em 1964 no idioma russo, Matveyev propôs um modelo de programa de treinamento periodizado que separava o ano de treinamento em diferentes fases e ciclos (Issurin, 2016).
A periodização do treinamento dividia o ano em três fases distintas: fase preparatória, fase competitiva e fase de transição. Cada fase do treinamento estava destinada a uma mudança de volume e intensidade. Na fase preparatória a ênfase era dada ao volume com o objetivo de desenvolvimento da capacidade aeróbica geral, resistência muscular, coordenação geral e preparação técnico-tática geral. Nas fases pré-competitiva e competitiva a ênfase era dada sobre a intensidade com reduções do volume, o treinamento era direcionado para exercícios específicos do esporte com exercícios de força/potência e técnico-táticas específicas (Issurin, 2010; Ratamess, 2012).
Os princípios do treinamento periodizado não eram comumente vistos na América do Norte durante a primeira metade do século XX. Por sua vez, a União Soviética havia se tornado uma potência Olímpica, o que foi principalmente atribuído a essa forma de planejamento do treinamento.
Considerando desde sua primeira participação (em 1952) até a sua dissolução (em 1991), das 9 participações (...e um boicote em 1984) da União Soviética, ela foi por 6 vezes seguidas o país com maior número de medalhas em jogos olímpicos. Portanto, foi considerada uma referência na preparação de atletas esportivos (Wikipedia, [s.d.]). O sucesso europeu levou cientistas e treinadores dos Estados Unidos a estudarem os métodos de treinamento do Leste Europeu e a desenvolverem modelos baseados no trabalho de Matveyev e seus predecessores (Issurin, 2016).
Mais tarde, principalmente nas últimas décadas, esse modelo de periodização passou a receber várias críticas por não contemplar modalidades esportivas que tinham o calendário competitivo prolongado, e que exigia alto desempenho esportivo ao longo do ano. Esse modelo também era inadequado para atletas de elite, pois, devido a longa fase de preparação geral, prejudicava a aplicação de carga específica, que é fundamental para o desenvolvimento do desempenho de atletas de elite (Issurin, 2010).
Neste contexto, modelos alternativos de periodização foram elaborados para tentar solucionar os problemas da 'periodização tradicional' de Matveyev. Na década de 80 surgiram o modelo de periodização em bloco multidirecionais, do Dr. Vladimir B. Issurin, e a proposta de periodização em bloco unidirecional com cargas concentradas, do Dr. Yuri Verkhoshansky (Issurin, 2008).
Durante a década de 1990, além dos Russos (ex: Matveyev, Ozolin e Verkhoshansky, Issurin), Alemães (D. Harre), Húngaros (Nádori), Ucranianos (V. Platonov), Americanos (ex: Stone, Kraemer, Fleck, O'Brian) e cientistas do esporte Romeno/Canadenses (T. Bompa) publicaram vários livros sobre periodização do treinamento (Bompa e Buzzichelli, 2019). Stone et al. (1982), por exemplo, baseando-se no modelo de periodização de Matveyev, desenvolveram um modelo de treinamento periodizado para o treinamento de força que se tornou bastante popular na área do treinamento de força devido a forma de progressão das variáveis volume e intensidade, que incluía 4 fases distintas:
> Fase de Hipertrofia/Endurance – treinos com alto volume e baixa intensidade.
> Fase de Força básica – treinos com moderado volume e alta intensidade.
> Fase de Força/potência – treinos de baixo volume e alta intensidade
> Fase de Repouso ativo – treinos de baixo volume e baixa intensidade.
Fleck (2011) caracterizou a periodização de Matveyev como tradicional ou clássica/linear, embora na proposta original de Matveyev essa progressão das variáveis volume e intensidade não era completamente linear (Issurin, 2010; Willams et al., 2017).
No final da década de 1980 surgiu outro modelo de periodização que foi muito bem recebido pela comunidade de treinadores. Mas esse modelo, proposto por Poliquin (1988) e denominado de 'periodização ondulatória' deixamos para a próxima postagem (está aqui). Também apresentamos nela alguns resultados de uma metanálise que nós conduzimos, a qual envolve esse último modelo.
Até o próximo post!
REFERÊNCIAS:
Todas as referências desse post estão 'linkadas' aos autores dentro do texto.
Leonardo Carvalho Caldas é Graduado e Mestre em Educação Física pela UFES, e atualmente é aluno de doutorado no mesmo programa de pós graduação. É Professor na faculdade Pitágoras de Linhares e técnico esportivo na prefeitura da Serra. Tem interesse em pesquisas na área do treinamento de força.
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