"(...) Portanto, temos aqui exemplos que atingiram 17,78g e 27,9g de proteína, respectivamente. E, também a título de ilustração, repare que uma pessoa de 70 kg que faz treinamento de força precisará apenas pouco mais de 100 g de proteína"
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Autora: Dra. Elaine Cristina Viana
Esta, sem dúvida, é uma pergunta muito recorrente para nutricionistas que trabalham com a orientação alimentar de praticantes de exercícios físicos e esportes. É também uma das perguntas que mais ouvi nos meus 17 anos de docência Universitária, ajudando a formar principalmente profissionais de Nutrição e Educação Física.
Entre leigos é comum o foco exclusivo em proteínas ou aminoácidos. Na internet, em particular nas redes sociais, é também comum grupos que discutem apenas esse tipo de questão: Quais e quanto de proteínas consumir? Ainda pior é quando resumem a conversa “a qual marca de suplemento”. Antecipo que em virtude da minha formação científica e ética, o que trago aqui são conhecimentos baseados em evidências científicas.
Em relação a pergunta que iniciei no título, não há uma resposta exata. Como é comum no inglês: “One size does not fit all”. Ou seja, um tamanho não serve para todos. Considerar as individualidades biológicas e os ambientes a que a pessoa está imersa, e associar isso com um conjunto de estratégias alimentares relacionadas à prática do exercício físico é, sem dúvida, a melhor, mais eficiente, e mais duradoura forma de promover o ganho de massa muscular.
Não há fórmula mágica capaz de promover ganho de massa muscular do dia para a noite, ou ainda afirmar com exatidão a quantidade de massa muscular que a pessoa conseguirá ganhar. É preciso também considerar questões relacionadas a percepção dos ganhos de hipertrofia e fatores intrínsecos ou biológicos dos quais temos pouca possibilidade de mudança, como previamente discutido aqui no Blog pelo Prof. Wellington Lunz (Post: Por que não consigo ganhar massa muscular?).
Do ponto de vista alimentar é preciso considerar uma série de fatores. Por exemplo, grande parte da população está exposta a alimentos processados e ultraprocessados pela indústria como demonstrado pela Pesquisa de Orçamento Familiar – POF 2018-2019 (IBGE, 2020), os quais contém grandes quantidades de óleos, açúcares, sal e outros produtos químicos na sua composição (Brasil, 2014). Tais alimentos ou produtos alimentícios estão fortemente associados ao aparecimento e agravamento de doenças crônicas como diabetes, hipertensão, obesidade (Levy et al., 2020, Baraldi et al., 2021).
Em virtude disso, pessoas que buscam o ganho de massa muscular precisarão também organizar melhor a sua relação com a comida para equilibrar os nutrientes, dentro do contexto de seus hábitos alimentares e rotina de exercícios físicos. O que percebemos na prática é que esta organização da alimentação, quando associada à melhora do estilo de vida (incluindo o próprio exercício físico), lazer e manejo dos fatores de estresse, já melhora os resultados relacionadas a ganho de massa muscular, sem necessidade de manipulação de apenas um nutriente específico.
Então, voltando a pergunta inicial deste post que é sobre qual a melhor ALIMENTAÇÃO (e não apenas proteína) para ganhar massa muscular, reforço que são os diferentes alimentos/nutrientes que compõem a alimentação, bem como o momento em que são ingeridos, combinados com outros fatores, seja biológico ou do próprio exercício, que irão atuar para as mudanças de composição corporal de praticantes de exercícios físicos, sejam estes saudáveis ou, em especial, quando acometidos de alguma doença (Aragon et al., 2017; Hernández-Reyes et al., 2019, Pérez, et al., 2019).
Uma vez exposta a complexidade do tema e deixando claro que para ganhos de massa muscular precisamos pensar em muitos aspectos, obviamente que não há qualquer problema fazermos análises sobre um ou outro nutriente. Podemos, claro, discutir sobre qual/quanto de proteína, carboidrato, gordura, micronutrientes, etc... Exatamente pela grandeza do tema precisamos, às vezes, diminuir o todo em partes menores para uma melhor compreensão. Por isso hoje vou me concentrar nos aspectos relacionados a proteínas, e noutro momento falarei de outros nutrientes e fatores relacionados.
Há mais de 10 anos a Diretriz da Sociedade Brasileira de Medicina do Esporte (Hernandez et al., 2009) ratificava o que já vinha sendo publicado por diretrizes anteriores: “...para a aqueles que tem por objetivo aumento de massa muscular, sugere-se a ingestão de 1,6 a 1,7 gramas por quilo de peso, por dia”. E ainda complementava:
“...os atletas devem ser conscientizados de que o aumento do consumo proteico na dieta além dos níveis recomendados não leva a aumento adicional da massa magra. Há um limite para o acúmulo de proteínas nos diversos tecidos”.
Se compararmos com a recomendação indicada para a população geral que é de 0,8 a 1,0 grama por quilo de peso ao dia (IOM, 2005), percebemos que mesmo nas condições de exercícios para ganho de massa muscular a quantidade de proteína que deve ser ingerida é relativamente baixa, especialmente para pessoas que adicionam algum suplemento proteico à sua alimentação.
Um aspecto também importante é a qualidade e quantidade proteica pós exercício (Thomas et al., 2016): a quantidade total a ser ingerida no período pós pode ser calculada levando em conta a regra de 0,25 a 0,30g por quilo de peso corporal, sendo 10g na forma de aminoácidos essenciais, ou pode-se considerar como recomendação geral 15 a 25g de proteína de boa qualidade entre 0 e 2h após o exercício físico. Isso porque não temos evidências fortes que demonstrem que ingestões superiores a 40g se associem com maior síntese de proteína muscular no período pós exercício. E lembrando que a recomendação total deve ser atingida nas 24 h após o exercício.
Jäger et al. (2017) publicaram também (como parte das recomendações da International Society of Sports Nutrition, 2017) outras atualizações recomendando de 1,4 a 2,0 gramas de proteínas por quilo de peso corporal ao dia para a maioria das pessoas que se exercitam. Isso é suficiente e, como se percebe, apenas um pouco acima do máximo proposto anteriormente.
Do ponto de vista da classificação, as proteínas de boa qualidade ou alto valor biológico são aquelas que contém todos os aminoácidos essenciais em sua composição, em quantidade e proporção adequadas, sendo capazes de promover o crescimento e assegurar a manutenção do balanço de nitrogênio (que se refere a relação entre a incorporação e eliminação de nitrogênio, elemento químico encontrado somente nas proteínas quando falamos de macronutrientes ingeridos). Os exemplos de alimentos para este tipo de proteína são laticínios, carnes, peixes, aves e ovos.
Já as proteínas de menor qualidade, ou baixo valor biológico, são as proteínas que não fornecem todos os aminoácidos essenciais em proporção adequada, não promovendo, portanto, o crescimento e balanço nitrogenado. São as proteínas das leguminosas, oleaginosas e outros grãos, como os cereais. Mas NÃO se deve esquecer do princípio da complementariedade. Ou seja, duas proteínas de baixo valor biológico podem, quando juntas, se complementarem e, assim, melhorarem o valor biológico da proteína. Um exemplo clássico é ‘leguminosa + cereal’, sendo o mais conhecido o famoso “arroz com feijão”.
Ainda em relação a refeição pós exercício, vou dar um exemplo que possa ser enxergado mais facilmente. Posso citar proteínas de alimentos comuns para a maioria das pessoas, como um lanche composto por: pão francês (4,91 g); ovo inteiro frito (7,81 g); maçã com casca in natura (0,38 g) e iogurte integral (média de diferentes sabores, pote 150 g = 4,68 g), totalizando 17,78g de proteína a ser ingerida no pós exercício.
E se considerarmos que o pão pode ser trocfffado por uma receita rápida e de porção individual de crepioca, por exemplo, que também inclui ovo e normalmente é recheada de queijo (exemplo: queijo minas frescal, 2 fatias médias) acrescentaríamos em torno de 10,12g, e neste caso, totalizaria 27,90g para este mesmo período.
Portanto, temos aqui exemplos que atingiram 17,78g e 27,9g de proteína, respectivamente. E, também a título de ilustração, repare que uma pessoa de 70 kg que faz treinamento de força precisará apenas pouco mais de 100 g de proteína (tabela de composição de alimentos).
Assim fica fácil perceber que é possível com uma refeição pós exercício rica em alimentos que são considerados boas fontes de proteína atingir facilmente a recomendação. Quero registrar que o exemplo do parágrafo anterior é apenas ilustrativo, pois a indicação deve levar em conta preferências alimentares ligadas, inclusive, a interesses e questões culturais, como também alguma restrição alimentar individualizada.
Já concluindo... Jäger et al. (2017) enfatizam que as recomendações consideradas já altas de proteínas, em torno de 2,3 a 3,2 g por quilo de peso ao dia, podem ser necessárias para maximizar a retenção da massa magra em pessoas que realizam exercícios de força (ou treinamento resistido) durante períodos de dietas hipocalóricas. Neste caso o aumento da quantidade de proteína compensa a falta de outro nutriente (ex: carboidrato) importante para compor a quantidade de calorias e ativação de outros mecanismos necessários para o processo de hipertrofia.
Aliás, a relação carboidrato e proteína e a forma como ocorre a distribuição destes dois componentes dos alimentos ao longo do dia é outro tema riquíssimo para ser discutido em outro post.
Diante desta breve abordagem, mais quantitativa que qualitativa, percebe-se que o melhor momento para a ingestão da proteína, sua distribuição ao longo do dia (em torno de 3 em 3 h) e com boa qualidade (rápida digestão e aminoácidos essenciais) são fatores que podem maximizar o ganho de massa muscular (Jäger et al. 2017), e devem ser incorporados à uma rotina individual que possa ser duradoura. Todas as recomendações devem ser entendidas como sendo capazes de interagir com as diferenças individuais das pessoas, sejam elas moldadas por fatores ambientais e biológicas.
Por último, exatamente pela complexidade que envolve a alimentação (fatores nutricionais, fisiológicos, químicos, sociais, culturais, etc.) é que oriento que sempre consulte nutricionistas. Sua saúde é seu maior patrimônio. E do ponto de vista orgânico, somos literalmente aquilo que comemos... Abaixo deixarei meu email e instagram para contato, comentários e dúvidas.
Até o próximo post!
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Autora: Elaine Cristina Viana é Nutricionista e Mestre em Nutrição pela Universidade Federal de Viçosa, Doutora em Ciências Fisiológicas pela Universidade Federal do Espírito Santo. Desenvolveu sua tese de Doutorado com pacientes de cirurgia bariátrica, e acumula mais de 17 anos de experiência na docência Universitária para estudantes de Nutrição e Educação Física, e orientação clínico-nutricional em clinica de Nutrição e em ambiente hospitalar para estudantes de Nutrição. E-mail: elainecviana@gmail.com.br. Instagram: @elainecristinavian
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