"Especificamente em relação a força, os ganhos podem superar 300%. Quanto mais fragilizada a pessoa, maiores são os ganhos esperados. E esses ganhos, principalmente nos membros inferiores, serão convertidos em maior funcionalidade e qualidade de vida"
Prof. Dr. Wellington Lunz - Universidade Federal do Espírito Santo
Nas últimas postagens de minha autoria aqui no Blog tenho tratado da relação entre treinamento de força e envelhecimento. Uma postagem (aqui) foi sobre um 'novo paradigma sobre envelhecimento', bem como sua relação direta com a idade biológica. A outra postagem (aqui) tratei do tema sarcopenia e dinapenia.
No Canal Prof Wellington Lunz (YouTube) tenho uma sequência de 6 vídeos sobre treinamento de força e envelhecimento (aqui). Mas como há quem prefira a forma digitalizada, optei por também tratar aqui esse importante conhecimento, de forma mais resumida. As/aos que gostam de videoaulas, fica o convite para assistir e se inscrever no canal.
A postagem de hoje é um resumo do quarto vídeo dessa série de ‘treinamento de força e envelhecimento’. E nesse vídeo dei uma dimensão dos benefícios do treinamento de força para pessoas mais velhas e idosos. Antecipadamente posso afirmar que ninguém se beneficia mais do treinamento de peso ou contrarresistência que idosos ou pessoas mais velhas.
Praticamente 100% dos estudos encontra enormes benefícios. Podemos destacar:
>> Aumento da força, resistência e potência muscular
>> Aumento do pico de torque isométrico e isocinético
>> Hipertrofia das fibras musculares
>> Aumento da flexibilidade
>> Melhora do equilíbrio
>> Aumento da densidade óssea
>> Diminuição da pressão arterial
>> Diminuição do percentual de gordura
>> Redução do risco de mortalidade por doenças cardiovasculares, cânceres de próstata e mama
>> Menor risco de quedas e fraturas
>> Menor declínio cognitivo
>> Menor nível de dor
>> Menor perda de funcionalidade geral
>> Melhora da autonomia nas tarefas diárias
Deixo aqui algumas referências interessantes (Fleck e Kraemer, 2017, Cunningham et al., 2019, Nuzzo; 2019). E sobre esses benefícios vale destacar que homens e mulheres são beneficiados de forma similar (Jones et al., 2020).
Especificamente em relação a força, os ganhos podem superar 300%. Quanto mais fragilizada a pessoa, maiores são os ganhos esperados. E esses ganhos, principalmente nos membros inferiores, serão convertidos em maior funcionalidade e qualidade de vida (Fleck e Kraemer, 2017, Nuzzo; 2019).
Um clássico estudo conduzido por Fiatarone & Cols e publicado na prestigiada revista JAMA na década de 1990 mostrou resultados impressionantes. Idosos entre 86 e 90 anos de idade, fragilizados pelo envelhecimento, realizaram treinamento de força por 8 semanas. O protocolo de treinamento progrediu de 50% a 80% de 1RM, sendo 3 séries de 8 repetições, 3 vezes por semana, com monitoramento da pressão sanguínea.
O ganho de força para membros inferiores médio foi de 174%, mas houve quem chegou a ganhar 374% de força. Apesar do treinamento relativamente intenso, nenhum participante precisou sequer de analgésico.
Em postagens anteriores, e nos meus vídeos, relatei que a perda de força decorrente do envelhecimento é maior que a perda de massa muscular. E como esperado, o ganho de força induzido pelo treinamento de força também supera o ganho de massa muscular. Ou seja, aquilo que habitualmente chamamos de ‘janela de adaptação’ é maior para força.
Por exemplo, nesse estudo citado previamente de Fiatarone & Cols o ganho de massa muscular foi em torno de 9%. Ou seja, muito inferior ao ganho de força, o qual variou de 61 a 374%. E além do ganho de força ter sido enorme, a velocidade média da marcha, que é um importante marcador de funcionalidade, também melhorou muito (em torno de 48%), e foi fortemente associado com a força do quadríceps.
Outro resultado interessante desse mesmo estudo foi que após 4 semanas de destreinamento, a perda de força foi apenas de 32%. Portanto, o treinamento de força entrega uma ‘reserva de força’, que além da relação direta com a funcionalidade física, também pode ser muito importante para eventuais imobilizações (ex: internação).
Detalhe: Imobilizações são muito debilitantes! Um clássico estudo que foi recentemente revisitado após completar 50 anos da sua publicação, mostrou que jovens de 20 anos de idade acamados por 21 dias tiveram prejuízos de parâmetros associados ao sistema cardiovascular (ex: VO2max) similares a 30 ou 40 anos de envelhecimento natural (Mitchell et al., 2019).
E uma reportagem recente trouxe a seguinte manchete: “Fisiculturista perde 30 kg após 62 dias na UTI por covid-19”. A pergunta que fazemos diante de um caso como esse é: ‘O quanto que essa reserva muscular contribuiu para a sobrevivência desse jovem fisiculturista?’ No mês de março de 2021 os dados apontavam que 83,5% das pessoas internadas em UTIs por complicações da Covid-19 não sobreviveram.
Sabemos há tempos que o músculo esquelético tem importante função endócrina (ex: secreção de citocinas), e recentemente compartilhei no meu perfil do instagram um estudo recém publicado que mostrou relação direta entre volume de massa muscular e proteção contra mortalidade induzida por choque séptico. Esse estudo mostrou que o músculo esquelético tem importante contribuição na função imunológica inata (Laitano et al., 2021). Os resultados foram obtidos em camundongos, de modo que ainda precisaremos de estudos em humanos.
Enfim, isso tudo nos dá um panorama da importância de se ter reserva funcional e reserva muscular antes de eventuais imobilizações.
Aliás, é importante ressaltar aos profissionais de Educação Física que prescrevem o treinamento de força, ou familiares que acompanham seus entes mais velhos, que uma eventual “ausência” de ganho de força e massa muscular após um treinamento de força não necessariamente significa ausência de efeito positivo.
Isso ocorre porque em pessoas mais velhas há perda acelerada dessas variáveis, e as vezes o treinamento de força apenas consegue desacelerar tais perdas. Como no âmbito científico a comparação pode ser feita com um grupo controle não treinado, os resultados são apresentados de forma comparativa, e obviamente darão ‘delta’ positivo. Afinal, se um grupo perde força e o outro mantém, a diferença entre esses grupos será um resultado positivo.
Atualmente, dada a reconhecida importância do treinamento de força para pessoas mais velhas, é muito pouco provável que um comitê de ética permita que se tenha um grupo controle não treinado, pois esse grupo perderia o benefício do treinamento.
Concluindo... Os benefícios do treinamento de força e potência são enormes! E considerando as postagens anteriores, em particular sobre sarcopenia e dinapenia, também é URGENTE aderir a um programa de treinamento de força (bem como aeróbio e flexibilidade). Não é apenas algo bom, é essencial. O chamado treinamento funcional também é uma excelente opção. Entretanto, em virtude da importância de cargas maiores para beneficiar a densidade óssea, é recomendável também manter o treinamento de força clássico para os que tiverem condições de trabalhar com cargas maiores. Mas sobre ‘prescrição do treinamento’ de força deixarei para uma postagem posterior.
Até o próximo post!
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Treinamento de força reduz o risco de doenças cardiovasculares? Ou é coisa para o exercício aeróbio?
Autor: Wellington Lunz é o proprietário desse Blog e do site www.wellingtonlunz.com.br. Também tem um canal no YouTube: (youtube.com/@prof.wellingtonlunz) onde transmite conhecimentos baseados em evidência de diferentes áres (ex: hipertrofia muscular, treinamento de força, musculação, fisiologia do exercício, flexibilidade). É bacharel e licenciado em Educação Física, Mestre em Ciência da Nutrição e Doutor em Ciências Fisiológicas. Atualmente é Professor Associado na Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Contato pelo site, e-mail: welunz@gmail.com.br
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