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"Não consigo ganhar massa muscular"... Saiba o porquê.

Atualizado: 15 de jul.



Por que não consigo ganhar massa muscular?

"Na maioria das vezes, tanto os aspectos relacionados ao treinamento como os relacionados a nutrição estão suficientemente atendidos nessas pessoas que me perguntam ‘Por que não consigo ganhar massa muscular?"


Autor: Prof. Dr. Wellington Lunz


Provavelmente a pergunta que mais tenho ouvido ao longo dessa minha trajetória de docente de treinamento de força, fisiologia do exercício ou musculação seja exatamente essa: ‘Por que não consigo ganhar massa muscular?

Diante dessa pergunta sempre precisamos fazer pelo menos duas outras questões que são óbvias para qualquer profissional de educação física: (1) “Como é seu treinamento?” (2) “Como é sua alimentação?” Escrevi aqui mais ou menos como falamos, sem muita preocupação com os aspectos formais da fala.

Considerando que caminha para o infinito as possibilidades de variação do treinamento e alimentação, temos então um prato cheio para o charlatanismo. O que mais podemos perceber na internet são pessoas vendendo promessas que exploram esses dois aspectos: Treinamento e nutrição.

Embora a pergunta sobre os ‘aspectos nutricionais’ seja óbvia, nem todas/os profissionais de educação física terão plena clareza do que seja uma nutrição ideal para ganho de massa muscular. E para isso precisamos sempre da ajuda de nutricionistas para uma melhor compreensão, preferencialmente com bagagem de conhecimento na área de nutrição esportiva.

Felizmente tenho a sorte de estar casado com uma nutricionista muito competente em nutrição esportiva e clínica há quase duas décadas (somando namoro, noivado e casamento... não sei se essa sequência relacional exista hoje em dia...rs!). Ambos, eu e ela, também tivemos o privilégio de cursar Mestrado em Ciência da Nutrição e, depois, Doutorado em Fisiologia.

Em virtude disso posso dizer que tenho razoável compreensão das demandas nutricionais para otimizar o ganho de massa muscular (Obs: nunca fiz prescrição nutricional... trata-se de prerrogativa de pessoas com graduação em Nutrição).



Bom... mas eu disse tudo isso até agora para chegar na seguinte fala: Na maioria das vezes, tanto os aspectos relacionados ao treinamento como os relacionados a nutrição estão suficientemente atendidos nessas pessoas que me perguntam ‘Por que não consigo ganhar massa muscular?’

Então, se os fatores relacionados ao treinamento e nutrição estão preenchidos, o que poderia explicar alguém não conseguir bons ganhos de hipertrofia?

Uma resposta possível, embora não seja exatamente onde quero chegar, é que frequentemente é apenas um problema de percepção. Ou seja, a pessoa está tendo ganhos de hipertrofia dentro do que cientificamente esperamos, mas essa pessoa percebe como insuficiente.

Isso é bastante comum, e curiosamente praticamente todos que me fazem tal questão NÃO sabem qual é o curso temporal esperado de ganho de massa muscular ao longo de um dado tempo. Sempre me lembro de uma história correlata em que uma moça objetivava perder peso, mas ela tinha IMC = 21. Ou seja, ela estava mais perto da magreza que da obesidade.

Mas esse desvio associado a percepção também não responde tudo, pois na maioria das vezes o ganho de hipertrofia realmente é menor que o esperado nessas pessoas. Então, vamos a resposta que acredito ser a que, cientificamente, faz mais sentido.

Os aspectos relacionados ao treinamento e nutrição chamarei aqui de fatores extrínsecos. Mas há outra dimensão muito pouco considerada, que são os fatores intrínsecos. Os extrínsecos são aqueles que podemos gerenciar (treinamento e nutrição), mas os intrínsecos (aspectos biológicos, fisiológicos, bioquímicos, metabólicos, etc.) temos pouco poder. Ainda que haja alguma possibilidade de mecanismos epigenéticos, ainda assim continuamos com pouco poder sobre esses fatores. Chamarei, as vezes, esses fatores intrínsecos apenas de "biológicos" para ser mais didático.


E é exatamente aqui que quero chegar... e para isso vou apresentar algum referencial.

Já sabemos há algum tempo que algumas pessoas são mais e outras menos responsivas ao ganho de massa muscular induzido pelo treinamento. Isso é tão claro que já temos experimentos/estudos que separam esses dois grupos (as vezes 3 grupos: pouco, médio ou muito responsivo) para se tentar comprender os componentes intrínsecos que explicariam tais diferenças (Morton e Cols, 2018; Schiaffino e Cols, 2020).

Vou apresentar agora algumas coisas bastante interessantes. Barcelos e Cols (2018) objetivaram comparar o efeito do treinamento de força (TF) com diferentes frequências semanais: 5, 3 ou 2 vezes/semana. Dez jovens ‘sem experiência’ (média 23 anos) realizaram 3 séries na cadeira extensora, com 9-12 repetições máximas (RM), 2 min entre séries, por 8 semanas.

Todos os participantes exercitaram uma de suas pernas 5 vezes/semana (total de 10 pernas), enquanto metade (5 pernas) realizou 3 vezes/semana e a outra metade (5 pernas) realizou 2 vezes/semana. Resumindo temos que 5, 3 e 2 vezes/semana totalizaram 15, 9 e 6 séries/semana, respectivamente. Ou seja, o volume de treinamento não foi igual. Apesar disso, o ganho de hipertrofia foi similar entre os grupos (medida no vasto lateral, usando ultrassom). Ou seja, o componente extrínseco (treinamento) não foi capaz de estabelecer diferenças entre os grupos.

Um outro estudo (Damas e Cols, 2018), que é desdobramento do anterior, aproveitou o experimento para fazer outras análises. Os pesquisadores agora dividiram 2 grupos, um chamado de alta frequência (5 vezes/semana) e o outro de baixa frequência (2 ou 3 vezes/semana). Ou seja, a diferença desse estudo é que os autores juntaram os grupos de 2 e 3 vezes/semana, certamente para aumentar o poder estatístico, mas também para tentar responder outras questões.

O resultado mais impressionante foi como essas ‘pernas’ responderam as diferentes frequências. Para hipertrofia, 6 pernas (33%) responderam mais usando alta frequência, 7 pernas (37%) responderam mais usando baixa frequência, e outras 6 pernas (32%) tiveram ganho similar, ou seja, independente de alta ou baixa frequência. Claro que o estudo mostra que o componente extrínseco é importante, mas que há um tipo de interação com fatores intrínsecos de cada corpo.

Há outro estudo (Scarpelli e Cols, 2020) liderado pelo cientista Cleiton A. Libardi, da Universidade Federal de São Carlos, que mostra algo consonante. Nesse estudo algumas pessoas tiveram maior ganho de hipertrofia aumentando em 20% a carga de treino, enquanto outras tiveram ganho apenas quando se reduziu bastante a carga de treino. Os dados individuais não estão no artigo, mas o Prof. Cleiton gentilmente me cedeu a planilha, e eu pude verificar as respostas individuais. Há, portanto, uma ‘dose ou carga’ de treinamento ideal para cada pessoa que depende de fatores biológicos.

Há outro artigo desse mesmo grupo de trabalho (Damas e Cols., 2019) que ratifica essa interpretação de forma ainda mais contundente. Vinte jovens treinaram por 8 sem com 2 programas diferentes de treinamento. Cada pessoa treinava uma perna com um protocolo convencional, e a outra perna com um protocolo variável. Apesar dos protocolos serem bem diferentes em termos de gerenciamento das variáveis, os autores não encontraram diferença para hipertrofia entre os grupos.

Mas o resultado mais impressionante desse estudo foi que a variabilidade ‘entre-indivíduos’ para síntese de proteína (MyoPS, 3,3%) e hipertrofia (CSA, 38%) foi aproximadamente “40 vezes maior” que a variabilidade ‘intra-indivíduo’. Como os cientistas investigaram as pernas de cada pessoa foi possível identificar que a síntese e hipertrofia entre as pernas do mesmo participante não foi muito afetada pelo tipo de programa do treinamento. Por outro lado, alguns participantes obtiveram muito mais ganho de massa muscular que outros usando o mesmo protocolo. Portanto, a capacidade intrínseca se mostra muito mais importante que fatores extrínsecos do treinamento de força.


Vários dos artigos citados acima eu também apresentei na videoaula 29 da playlist de treinamento de força no meu Canal no YouTube. Fica o convite para quem prefere a plataforma de vídeo (clique aqui).

Você, então, poderia me perguntar: Mas considerando tudo isso, não há o que fazer?

Sim, há o que fazer... mas precisamos reconhecer que cada pessoa tem uma capacidade diferente da outra. E o que podemos fazer é um treinamento o mais eficiente possível para que cada pessoa possa obtenha o maior ganho possível. O que não devemos fazer é comparar o ganho de A com B.

Em relação a "treinamento eficiente" também convido a assistir outra videoaula sobre o assunto (aqui).

Esses estudos que citei (...e orgulhosamente a maioria deles conduzida por cientistas brasileiros vinculados a instituições públicas de ensino e pesquisa), os quais ratificam a ideia de que a capacidade intrínseca é muito determinante para o ganho de massa muscular, não afirmam que as variáveis de treinamento não tenham qualquer importância. Se você voltar aos resultados desses estudos verá que as pernas de uma mesma pessoa respondia de forma diferente para diferentes protocolos de treinamento. Isso significa que há uma ‘dose ou carga’ (componente extrínseco) de treinamento ideal para cada componente biológico (componente intrínseco). Em resumo, há uma relação ideal entre esses dois componentes (intrínseco e extrínseco).

Do ponto de vista do treinamento para ganho de massa muscular precisamos, então, de minimamente duas coisas: Descobrir a ‘dose ou carga’ ideal para cada pessoa e, também, reconhecer que os ganhos que uma pessoa obterá não será igual a da outra. Há quem responde mais e há quem responde menos.

E, para finalizar, não esqueça de outros componentes extrínsecos importantes: Nutrição e descanso ideal (esse último já faz parte do treinamento, mas é bom enfatizar aqui... há quem ache que o estímulo é mais importante que o descanso... outro erro!).

Pra finalizar... em particular para você que não é profissional da área, toda vez que lhe oferecerem coisas milagrosas, cuidado! Podem estar apenas mercantilizando sua esperança.


Até o próximo post!


Clique aqui e acesse videoaulas no 'Canal Prof. Wellington Lunz'.






REFERÊNCIAS:

As referências estão como link nos autores descritos no post.

 

Wellington Lunz é o proprietário desse blog e do site www.wellingtonlunz.com.br. Também tem um canal no YouTube: https://bit.ly/3mPwRq0 onde transmite conhecimentos baseados em evidência de diferentes disciplinas (ex: treinamento de força, musculação, fisiologia do exercício). Possui formação em Educação Física, Mestrado em Ciências da Nutrição, Doutorado em Ciências Fisiológicas e é Professor Associado da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Contato pode ser feito pela 'página contato’ do site ou welunz@gmail.com.br.

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