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Ser muito musculoso aumenta o risco de diabetes e resistência à insulina?

Atualizado: 4 de fev.



Ter muita massa magra aumenta a resistência à insulina?

"Pelo menos até meados da década de 1980 sempre se acreditou que uma maior massa magra estaria associada com um perfil metabólico mais saudável"



Autor: Dr. Divanei Zaniqueli


A resistência à insulina (RI) é um distúrbio complexo caracterizado por falha das células-alvo em responder aos níveis normais de insulina circulante, resultando em hiperinsulinemia compensatória como tentativa de manter a homeostase glicêmica (Ye 2007, Mlinar et al. 2007).

A RI é uma condição clínica comum a uma série de distúrbios metabólicos, incluindo diabetes tipo 2, dislipidemia, síndrome metabólica e hipertensão (Reaven 1988). Estudos observacionais mostraram que a prevalência de RI é maior em pessoas com sobrepeso e obesidade (McLaughlin et al 2003, Reyes-Muñoz et al. 2016). Uma investigação prospectiva (Risérus et al., 2007) associou o aumento de 2,8 kg/m2 no índice de massa corporal (IMC) em 20 anos a uma diminuição de 19% na sensibilidade à insulina medida pelo clamp euglicêmico em homens mais velhos.

Pelo menos até meados da década de 1980 sempre se acreditou que uma maior massa magra estaria associada com um perfil metabólico mais saudável. Esta suposição foi apoiada por estudos indicando que as respostas da glicose e da insulina foram melhores em fisiculturistas do que em indivíduos com obesidade no teste de tolerância oral à glicose (Yki-Jfrvinen et al. 1984, Szczypaczewska et al. 1989). No entanto, um estudo lançou dúvidas sobre o papel da massa magra absoluta como um único determinante da ação da insulina, uma vez que os obesos pareados por peso tinham tolerância mais baixa à glicose, apesar da massa magra semelhante em comparação com os fisiculturistas.

Desde então, vários estudos, incluindo grandes coortes populacionais (Castaneda e Janssen 2005, Weber et al. 2014), abordaram o tema da associação entre massa magra e RI, e resultados contrastantes foram relatados, ora com associação positiva (Ghachem et al. 2019), ora negativa (Atlantis et al. 2009) ou mesmo com nenhuma associação (Aubertin-Leheudre et al. 2007) entre maior massa magra e RI.



É fundamental considerar que, na análise da composição corporal, a quantidade de massa gorda corporal é normalmente proporcional a massa magra. Ou seja, pessoas mais gordas também tendem a ter grande quantidade de massa magra. Portanto, é crucial corrigir a massa magra por um fator que reduza ou suprima a interferência mútua entre massa magra e massa gorda, já que os diferentes métodos de indexar adequadamente a massa magra devem ser a principal fonte de viés, explicando parte dos resultados conflitantes entre os estudos.

Dado o papel do tecido muscular como um importante regulador da homeostase sistêmica da glicose, nosso grupo investigou se a massa magra seria um preditor de RI em pessoas adultas após indexar a massa magra de forma a corrigir sua colinearidade com a massa gorda.

Para cumprir essa finalidade nós analisamos o banco de dados da segunda onda do projeto ELSA-Brasil, que contou com dados de 15.105 pessoas de 35 a 74 anos de idade de ambos os sexos. Após as exclusões de diabéticos e pessoas com dados não validados, as análises foram realizadas com 11.284 voluntários. A massa magra e a massa gorda foram obtidas por impedância biolétrica tetrapolar com oito pontos tácteis.

A massa magra foi dividida pela área de superfície corporal (MM/ASC). Essa se mostrou a melhor forma de eliminar a colinearidade entre massa magra e massa gorda, uma vez que a correlação entre a massa magra indexada e a massa gorda foi de -0,07 para mulheres e -0,10 para homens. A presença de RI foi diagnosticada através do cálculo do índice HOMA, e a tolerância a glicose prejudicada foi diagnosticada com o teste oral de tolerância a glicose de 2 horas.



Nossos principais achados revelaram que independente do excesso de gordura corporal e outros fatores de confusão, a presença de RI diagnosticada pelo índice HOMA foi mais provável quando a massa magra era maior. Em claro contraste, a massa magra não teve qualquer associação com tolerância a glicose prejudicada.

Do nosso ponto de vista, a ideia de maior chance de RI associada a maior massa magra parece contraintuitiva, dada a importância da massa muscular (maior proporção da massa magra) para a homeostase do metabolismo glicídico. De fato, é bem conhecido que o músculo esquelético é o principal tecido relacionado à captação de glicose estimulada pela insulina (Deshmukh, 2016). Além disso, tem sido sustentado que a quantidade de músculo esquelético pode ser um determinante crítico da sensibilidade a insulina. Alinhados com esses pressupostos, nossos achados e os de outros estudos mostraram uma relação inversa entre a massa magra/muscular e medidas indicadoras do metabolismo da glicose (Castaneda e Janssen 2005, Tripathy et al. 2014).

Diante disso, e já finalizando esse post, duas principais questões devem ser vistas com cautela:

Primeiro é a falibilidade dos índices de correção da colinearidade entre a massa magra e a massa gorda. Pelas nossas observações, os estudos que indicaram a associação positiva entre massa magra e RI utilizaram a divisão da massa magra pela altura ao quadrado (MM/altura2) como forma de indexar a massa magra. Com nossos dados nós testamos essa indexação e observamos que aqueles com maior massa magra indexada são também aqueles com maior massa gorda, e com maior proporção de obesos.

Segundo é que a habilidade do índice HOMA para diagnosticar a RI em pessoas com maior massa muscular pode apresentar limitações. Isso sugere que a RI pode ser diagnosticada erroneamente em adultos com maior massa magra.

Concluindo com uma resposta (resumida) para a pergunta do título... Sim, é possível que uma pessoa com muita massa magra possa ter RI, mas isso não significa que a causa da RI seja a massa magra, mas fatores associados (ex: excesso de tecido adiposo) ou limitação da técnica de medida.


Até o próximo post!


Clique aqui e acesse videoaulas no 'Canal Prof. Wellington Lunz'.







REFERÊNCIAS:

As referências estão como link nos autores descritos no post.


 

Autor: Divanei Zaniqueli tem formação em Educação Física, Mestrado e Doutorado em Ciências Fisiológicas. Atualmente atua como Profissional de Educação Física na Saúde na Prefeitura Municipal de Vitória. Contato: divozaniqueli@hotmail.com

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