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Dá para hipertrofiar mais uma região muscular que outra?

  • Foto do escritor: Blog Prof. Wellington Lunz
    Blog Prof. Wellington Lunz
  • 26 de nov. de 2024
  • 6 min de leitura

Atualizado: 21 de mar.

hipertrofia não uniforme hipertrofia heterogênea localizada regional local

Prof. Dr. Wellington Lunz

Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)

Hipertrofia não uniforme (ou hipertrofia não homogênea; ou hipertrofia heterogênea) induzida pelo treinamento de força ou contrarresistência refere-se ao aumento de massa muscular desproporcional em diferentes regiões (ex: proximal, medial e distal) do mesmo músculo treinado.

Vale tanto para a hipertrofia longitudinal (em série; aumento do comprimento das fibras musculares) quanto para a hipertrofia radial (em paralelo; aumento do diâmetro das fibras musculares).

E a arquitetura muscular (ex: ângulo de penação; comprimento das fibras) também pode ser afetada pelo tipo de ação muscular, como nas ações concêntrica vs. excêntrica.

Há quem chame tal fenômeno de outros nomes: hipertrofia localizada (mas, na verdade, toda hipertrofia é localizada), hipertrofia regional, hipertrofia seletiva ou hipertrofia muscular regional.

Independente do nome, há, de fato, um fenômeno interessante aqui:

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‘Por que um músculo treinado com a mesma intensidade externa e com o mesmo volume de carga não hipertrofia igualmente em todas as regiões?’

Para além da curiosidade científica, a resposta a tal questão tem importância prática, por ter repercussão na prescrição do treinamento. Afinal, há pessoas que podem (e é bem comum) desejar ter mais hipertrofia nas regiões proximal, medial ou distal; ou nas regiões inferior, superior, lateral, interna. Enfim, vamos entender:

Músculos esqueléticos grandes possuem normalmente centenas de unidades motoras (UMs) (UMs = conjunto de células musculares inervadas pelo mesmo neurônio motor). E há músculos que podem ter diferentes ramos nervosos, de modo que as UMs não são todas controladas pela mesma eferência nervosa. Isso já ajuda a entender a próxima afirmação:

'As células musculares contidas em um músculo não são todas ativadas simultaneamente'.

Aliás, esse entendimento nos levou ao conceito de grupo de tarefa, que basicamente se refere ao conjunto de UMs que trabalham juntas para executar uma determinada tarefa ou movimento.

Creio que não é difícil de acreditar nessa capacidade do sistema nervoso escolher UMs para determinadas tarefas. Quem já estudou fisiologia muscular se lembrará que para realizarmos tarefas que exigem precisão (tarefa motora fina) nosso sistema neuromotor escolhe UMs menores, e para tarefas que exigem muita força (tarefa motora grossa), escolhe UMs maiores.

Deve-se lembrar também que para tarefas que exigem pouca força, as UMs recrutadas são as do tipo I, e se a tarefa exigir muita força, o sistema neuromotor recrutará também UM tipo II.

Temos ainda o princípio da compatibilidade neuromecânica (neuromechanical matching), que, a meu ver, oferece os melhores argumentos (já fiz post sobre isso: aqui) sobre essa capacidade de recrutamento seletivo de UMs. E, claro, nos ajuda a entender por que a hipertrofia muscular induzida por treinamento de força não é uniforme.

De forma bastante resumida, o neuromechanical matching refere-se ao recrutamento seletivo de UMs, estando condicionado à eficácia ou eficiência mecânica das UMs. O sistema nervoso parece priorizar o recrutamento das UMs com maiores eficiências para cada tarefa motora, podendo, inclusive, desobedecer ao princípio de Henneman (também falei dele no mesmo post).

Em resumo, parece bem possível afirmar que ‘há atividade regional de subpopulações de UMs’.

A expressão ‘contrair o músculo’ não significa, portanto, ativação e contração do músculo inteiro. E isso, claro, é importante para a eficiência neuromuscular.

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O Prof Wellington Lunz apoia e recomenda o Instituto Afficere. Agende sua consulta nutricional.

Mas esse conhecimento que destaquei no parágrafo anterior também revela a incapacidade de nossas consciências. Ou seja, se pedirmos conscientemente para o músculo hipertrofiar mais na região proximal, ou medial, ou distal, ele não obedecerá. Apesar de podermos ordenar a contração, a escolha de quais UMs recrutar não está sob controle voluntário.

Portanto, se você anda questionando se há estratégia específica para hipertrofiar mais uma região muscular do que outra, a única coisa que poderemos fazer é buscar por estudos científicos que investigaram o efeito de exercícios ou ações musculares específicas.

E esbarraremos num problema: ' evidências indiretas demais, e evidências diretas de menos'. Estamos longe de uma ‘exercicioteca’ que possa nos servir de guia.

Por exemplo, apesar de todo mundo prescrever o supino inclinado, reto e declinado para hipertrofiar as regiões clavicular, esternocostal e abdominal do peitoral, respectivamente, eu desconheço evidências diretas. Aliás, para não dizer que não conheço nada, há o estudo de Chaves et al. (2020) que mostrou que o supino inclinado foi realmente melhor para hipertrofiar a região mais alta do peitoral, mas ele não foi pior para hipertrofiar regiões mais baixas. Mas quase tudo que temos são evidências indiretas com eletromiografia (e eletromiografia não é guia para hipertrofia, veja esse meu post aqui).

Também sabemos que o exercício agachamento é bom para hipertrofiar os músculos vastos da coxa e glúteo máximo, mas não para o reto femoral e os isquiotibiais biarticulares (veja meu post: Treinar com a musculatura alongada gera mais hipertrofia muscular?). A máquina 'panturrilheira' hipertrofia o músculo sóleo, mas não os gastrocnêmios (Kinoshita et al., 2023). Mas esses casos, embora interessantes e úteis para tomada de decisão, não se referem ao 'mesmo músculo', que é o interesse desse post. 

Mas temos algumas possibilidades, fruto de algumas produções científicas de boa qualidade. Veja:

Há pelo menos dois bons estudos (Seger et al., 1998; Franchi et al., 2014) que mostraram que ações excêntricas tendem a gerar mais hipertrofia muscular na região distal, enquanto ações concêntricas geram mais hipertrofia na região medial. Para a região proximal ainda não dá para afirmar.

Já até vi um estudo mostrando que ‘salto contramovimento’ gerou mais hipertrofia na região proximal, mas, além de ser um único estudo, fica restrito aos membros inferiores.

Embora esses dois estudos (Seger et al., 1998; Franchi et al., 2014) foram bem conduzidos, com excelente técnica de medida e boa magnitude de efeito, ainda precisamos de mais trabalhos para diminuir a incerteza. Mas isso não te impede de tentar.

E recomendo prudência com as ações excêntricas. Se for fazê-las com carga máxima, sugiro não passar de 10 reps/sessão em iniciantes. E eu não passaria de 30 reps em pessoas muiiiito treinadas. O nível de estresse com 30 reps máximas já é bastante grande, e acima disso é perigoso (há risco de rabdomiólise; obs: rabdomiólise pode até matar).

Vale dizer que há mais estudos mostrando o seguinte: ações excêntricas tendem a aumentar o comprimento do fascículo e diminuir o ângulo de penação, enquanto ações concêntricas tendem ao oposto. E essas coisas podem ter repercussões diferentes na força e potência.

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Outra coisa: alguns estudos (Sato et al., 2021; Pedrosa et al., 2021) mostraram que realizar exercícios com a musculatura mais alongada tente a produzir mais hipertrofia na região distal. Mas treinar mais encurtado não gerou melhor resultado para as regiões medial ou proximal. Também precisaremos de mais estudos de grupos de pesquisas independentes. De qualquer forma, são coisas que você pode tentar. Mal não fará.

Mas se aparecer por aí um super 'influencer' dizendo que o exercício X ou Y é o melhor para hipertrofiar mais embaixo, em cima, do lado, dentro, etc., então você precisará pedir a ele os trabalhos que evidenciam isso.

E (embora eu duvide) se realmente existir algo, precisará avaliar o nível de confiança desses trabalhos. Mas, se o 'influencer' disser que se baseia na experiência dele, registro que: 'opinião de especialista não é evidência' (ver o sistema GRADE). O nível é zero!

Então é isso, amiga e amigo... Obrigado por acompanhar até aqui. E se você gostou, compartilhe com colegas e amigos/as ou em suas redes sociais. Quem quiser receber os novos posts deste Blog, inscreva-se na Newsletter.

E, como habitual, em tempos de escritas por inteligência artificial (ex: ChatGPT e Gemini), vale dizer que essa postagem é feita exclusivamente das minhas leituras e interpretações ao longo da minha trajetória. Se quiser citar este post, pode ser mais ou menos assim:

Lunz, W. Dá para hipertrofiar mais uma região muscular que outra? Ano: 2024. Link: https://www.wellingtonlunz.com.br/post/como-hipertrofiar-mais-uma-regiao-do-musculo [Acessado em __.__.____].

 
professor wellington lunz

Autor: Wellington Lunz é o proprietário desse Blog e do site wellingtonlunz.com.br. Tem se dedicado em transmitir conhecimentos baseados em evidências em diferentes áreas do conhecimento (ex: hipertrofia muscular, treinamento de força, musculação, fisiologia do exercício, flexibilidade). É bacharel e licenciado em Educação Física, Mestre em Ciência da Nutrição e Doutor em Ciências Fisiológicas. Atualmente é Professor Associado na Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Contato pelo site ou e-mail: welunz@gmail.com.br  





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